Os cálculos renais atingem cerca de 1 à cada 8 pessoas em todo o mundo, um número que tem aumentado. Eles atingem de maneira semelhante homens (11%) e mulheres (9%).
Durante a crise de cólica renal as dores podem ser insuportáveis e lembrar à “dor do parto”.
Escrevi esse artigo com o objetivo de entregar, de maneira simplificada, todas as informações relevantes para pacientes que sofrem com pedras nos rins.
O que são os cálculos renais
Os cálculos renais são formados pelo agrupamento e precipitação de cristais presentes na filtragem da urina dentro do sistema de escoamento dos rins, chamado de sistema coletor. Esse processo leva a formação de verdadeiras pedras que podem passar despercebidas por anos ou até causar sintomas intensos em curto tempo.
Tenho dor nas costas, é calculo?
O cálculo renal nem sempre é doloroso, muitas vezes ele é descoberto de maneira acidental por exames de imagem feitos por motivos diversos.
Quando sintomático, pode causar dores intensas, geralmente súbitas, que vão da região lombar até a região inguinal do lado afetado, podendo acometer até o escroto nos homens ou grandes lábios nas mulheres. Também é frequente que as crises de dor sejam acompanhadas de náuseas ou vômitos e sangue na urina. Febre não é comum e pode indicar a presença de infecção associada, o que deve ser encarado como sinal de gravidade, necessitando de avaliação médica breve.
A dor relacionada ao cálculo renal acontece quando há obstrução do sistema de drenagem dos rins pelo cálculo, dessa forma, como a urina é produzida de maneira contínua pelo rim, ocorre um certo represamento e distensão do sistema coletor (hidronefrose) e da cápsula renal ocasionando à colica.
Cálculos não obstrutivos calicinais , portanto, não causam obstrução e também dificilmente causam dor. Por outro lado, calculos localizados no ureter – fino sistema de drenagem que leva a urina do rim até a bexiga – geralmente são acompanhados de dor intensa.
Dores nas costas de longa evolução, baixa intensidade, que acontecem dos dois lados,que são associadas ao trabalho ou atividade física, ou com irradiação para as pernas geralmente não estão associadas à calculos e podem ter origem muscular ou na coluna.
Diagnóstico – Como descobrir se tenho cálculo?
O diagnóstico de cálculos renais requer exames de imagem.
O melhor exame para verificação da existência de cálculos renais é a tomografia de abdome total sem contraste, detectando mesmo cálculos muito pequenos em mais de 90% das vezes.
O ultrassom de abdome também é um bom método de diagnóstico e serve como bom exame de triagem. Esse método tem o benefício de não emitir radiação, sendo o exame de escolha em grávidas.
O Raio X é um exame menos preciso e pode ser utilizado para planejar tratamento em cálculos grandes ou verificar o posicionamento do cateter duplo J.
A ressonância magnética não detecta cálculos com precisão, mas pode ser usada em alguns poucos casos de cálculos em gestantes.
Exames de urina e sangue são úteis em momentos de crise de cólica ou na prevenção da recorrência de cálculos.
Tipos de cálculos
Os cálculos são classificados pela sua composição e existem quatro tipos principais:
1- Oxalato de cálcio:
Esse é o tipo mais comum de cálculo renal e se forma pela união do cálcio com o oxalato na urina. Ingesta baixa de cálcio na dieta ( não precisa parar de beber leite, ok?) , beber pouca água, consumo excessivo de alimentos ricos em oxalato, sal, cirurgia bariátrica, podem contribuir para sua formação.
2- Ácido úrico:
Cálculos associados à produção excessiva de ácido úrico, geralmente por via dietética ou familiar. Pacientes com dietas muito ricas em carne vermelha, frutos do mar, peixes e cerveja tem risco aumentado.
3- Estruvita
São cálculos associados à infecções urinárias de repetição, principalmente, por bactérias produtoras de urease como o Proteus e a Klebsiella.
4- Cistina
São cálculos raros e de origem genética.
Consequências e possíveis complicações dos cálculos renais.
Existem diversas complicações relacionadas com cálculos renais não tratados, o que demanda atenção por parte de todos que já tiveram ou têm pedras nos rins.
Quando ocorre migração do cálculo e consequentemente entupimento do rim o paciente terá fortes dores abdominais e lombares. Caso não seja feito nada e o paciente suporte a dor, boa parte dos cálculos será eliminada. Porém, se esse cálculo demorar para ser eliminado ( mais de 3-4 semanas), estiver acompanhado de infecção ou de piora da função renal ele deve ser tratado.
Complicações mais raras e também mais graves envolvem a perda de função do rim afetado, podendo inclusive levar o paciente à doença renal crônica e eventualmente hemodiálise.
Outra séria complicação é o quadro de sepse – infecção grave e potencialmente fatal – que pode ocorrer em casos associados com infecção e piora do estado geral.
Diante disso, recomendo que toda pessoa que tenha recebido o diagnóstico de cálculo renal faça uma consulta com urologista para definir um plano terapêutico para o seu caso.
Tratamento
Sabemos que nem todos os casos de cálculos precisam de tratamento e se resolvem sozinhos, porém, em cerca de 20% dos casos é necessário algum tratamento cirúrgico.
O melhor tratamento vai variar de caso à caso e levamos em consideração o tamanho do cálculo, a posição que ocupa dentro do sistema coletor, fatores anatômicos do paciente e a presença ou não de infecção.
Existem diversas formas de tratar pedras nos rins, vou destacar as quatro formas mais comuns abaixo.
Litotripsia extracorpórea – LECO.
A litotripsia extracorpórea, ou LECO, é um dos tratamentos mais antigos para cálculos renais, porém, com a evolução tecnológica e miniaturização dos instrumentos urológicos, tem sido utilizada com menor frequência.
Na LECO o aparelho é posicionado de maneira externa ao corpo,então é aplicada uma camada de gel na pele do paciente e verificado o posicionamento do aparelho em relação aos cálculos com auxílio de Raio X.
Após todo esse planejamento, o procedimento se inicia e o aparelho realiza compressões mecânicas, uma espécie de “socos”, que transmitem as ondas mecânicas até o rim e fragmentam o cálculo.
Esse tratamento é indicado para cálculos que se encontram dentro do rim, não muito grandes e não muito duros, geralmente com tamanho por volta de 1cm e densidade medida pela tomografia por volta de 1000 UH.
Não é uma opção muito boa para pacientes obesos e está contraindicado em grávidas.
A litotripsia extra corpórea pode ser realizada fora ou dentro do bloco cirúrgico e com ou sem sedação.
Nefrolitotripsia percutânea
A nefrolitotripsia percutânea é o tratamento de escolha para cálculos muito volumosos que se encontram dentro dos rins, sendo realizado necessariamente em bloco cirúrgico.
O procedimento é realizado através de uma ou mais pequenas incisões na região lombar do paciente (“per-cutâneo”) , o rim é então puncionado, com auxílio de raio X ou ultrassom, o urologista realiza uma dilatação do trajeto e introduz o aparelho diretamente no rim para , à partir desse momento, iniciar a fragmentação dos cálculos.
O cateter duplo J apesar de frequentemente utilizado, não é obrigatório nessa cirurgia nos casos de extração completa do cálculo. Para casos mais complexos também pode ser utilizada uma drenagem externa do rim através do cateter de nefrostomia.
Ureteroscopia flexível à laser – UTL flexível.
O ultimo procedimento indicado para tratamento dos cálculos renais é a ureteroscopia flexível à laser. Essa cirurgia é indicada em mais situações do que as anteriores, sendo utilizada principalmente no tratamento de cálculos situados dentro do rim ou no ureter proximal ( próximo à saída do rim ou “ureter alto”).
Essa cirurgia é realizada de maneira pouco invasiva, por dentro do canal urinário, sem a necessidade de cortes. Necessita ser realizada no bloco cirúrgico e possui rápida recuperação.
Nela, o procedimento é iniciado através da uretra, a saída do ureter é identificada e então é posicionada uma bainha interna, através dela, o ureteroscópio sobe até a posição que se encontram os cálculos e a fragmentação é feita através de fibra laser.
Os fragmentos maiores são retirados através de uma pequena cesta, chamda Baskett, fragmentos menores não são retirados e saem sozinhos no pós operatório.
Ao final do procedimento é posicionado um cateter duplo J, o tempo de permanência vai variar conforme avaliação do seu urologista, geralmente por volta de 2 semanas.
Em comparação com as técnicas anteriores, a UTL flexível possui eficácia maior que a LECO, porém, com a necessidade de internação e procedimento em bloco cirúrgico. Quando comparada à Percutânea, possui eficácia menor para cálculos maiores que 2 cm, porém, possui menor agressividade e taxa de complicações.
Não existe “receita de bolo” em relação ao tratamento de cálculos renais e cada caso deve ser avaliado individualmente pelo seu urologista.
Ureteroscopia rígida – UTL rígida.
A ureteroscopia rígida é o tratamento de escolha para cálculos de ureter, especialmente os localizados no terço médio ou distal.
O procedimento também é realizado por dentro da via urinária, de maneira minimamente invasiva e com rápida recuperação.
O procedimento se inicia através da uretra, o ureter é identificado, sendo então posicionado um fio guia. O aparelho é introduzido através do ureter até encontrar o cálculo, a pedra é fragmentada com litotritores ou com laser e seus fragmentos são retirados com auxílio da cesta Baskett.
Ao final do procedimento geralmente é posicionado o cateter duplo J, o tempo de permanência geralmente é curto desde que o cálculo seja completamente extraído.
O que é o cateter duplo J? Preciso dele?
O cateter duplo J é um sistema de drenagem interno da via urinária e pode ser utilizado em diversas situações: pós operatório de cirurgia de cálculos ou reconstruções do trato urinário, drenagem de obstruções do sistema urinário, compressão por tumores,etc.
O cateter leva esse nome por possuir as duas pontas dobráveis, simulando a letra J ou um “rabo de porco”.
Em sua composição o cateter possui vários pequenos furos, dessa forma, a urina produzida no rim entrará por esses canais e será direcionada para a parte inferior do cateter, sem que qualquer mecanismo de obstrução impeça.
Essa característica é muito útil no pós operatório de cálculos renais, pois, com a manipulação do ureter ocorre uma inflamação do mesmo, que pode se fechar e gerar distensão e cólica. Além disso, ele previne que coágulos ou fragmentos dos cálculos tratados obstruam o ureter e causem dor semelhante à do pré operatório.
Por outro lado, apesar dos benefícios citados, o cateter duplo J também pode gerar incômodo. Não é infrequente que pacientes que utilizam o duplo J sintam dor lombar, ardência, tenham sangramentos urinários ou que urinem com maior frequência.
Durante o uso do cateter o paciente possui algumas pequenas restrições: deve evitar alimentos ou bebidas irritativas para a bexiga, evitar atividade física intensa e deve ingerir líquidos em boa quantidade. Vale a pena ressaltar que todos os sintomas que podem acompanhar o duplo J são passageiros, o cateter dificilmente se desloca ou prejudica o estado de saúde do paciente.
Portanto, o cateter duplo J não deve ser encarado como vilão, sendo uma parte importante de vários tipos de tratamento urológicos. Converse com seu urologista sobre o menor prazo viável do seu uso.
Prevenção de cálculos
Pacientes que tiveram história de cálculos renais tem 50% de chance de apresentar novo cálculo no prazo de 5 anos, especialmente, aqueles que não fizeram nenhum tipo de avaliação urológica e não mudaram seus hábitos de vida.
A avaliação das possíveis formas de prevenir as pedras envolve uma avaliação do estilo de vida, dieta, composição da urina, sangue e do cálculo.
Existem recomendações gerais que se aplicam à praticamente todos os pacientes, são elas:
- Beba uma quantidade adequada de água – o suficiente para a urinar ficar clara.
- Evite abuso de proteínas
- Consuma a quantidade adequada de cálcio, presente principalmente no leite e seus derivados.
- Realize atividades físicas regulares
- Evite o uso de refrigerantes e de bebidas alcoólicas, especialmente cerveja.
Meu nome é Vítor Eugênio Ribeiro, sou urologista e possuo ampla atuação no tratamento e prevenção de cálculos renais. Clique no botão ao lado e marque uma consulta.
Bibliografia:
Kidney Stones – National Kidney Foundation
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