A estenose de junção ureteropélvica (JUP) representa um problema relativamente incomum em adultos, mas pode ser responsável por efeitos deletérios graves como dor, pielonefrite e até falência renal.
A abordagem dessa condição em adultos é um tema menos estudado em relação ao tratamento em crianças e possui particularidades. Esse artigo tem o intuito de fornecer tudo o que você precisa saber sobre a estenose de JUP propriamente dita e como lidar com esse problema.
Meu nome é Vítor Eugênio Ribeiro, sou Urologista e Uro-oncologista (CRM: 75.054 / RQE: 60.679), especializado em Cirurgia Robótica e tratamentos minimamente invasivos. Espero que aproveite a leitura e estou à disposição para te atender em consulta caso necessário.
O que é a Estenose de JUP?
A estenose de JUP representa um estreitamento no sistema de escoamento do rim, mais precisamente na pelve renal. Essa obstrução pode causar um acúmulo de urina dentro do sistema coletor, gerando o que chamamos de hidronefrose – dilatação renal.
Quando não é tratada, a estenose da junção ureteropélvica (JUP) pode resultar em obstrução progressiva no sistema coletor renal. A hidronefrose pode aumentar, ocorrendo distensão não só da pelve renal, mas também dos cálices, levando à fibrose intersticial, perda de néfrons e, em última instância, insuficiência renal.
Portanto, um manejo eficaz é crucial, o que exige a identificação precoce de sinais e sintomas, um diagnóstico preciso e tratamento adequado.
Sinais e Sintomas da Estenose de JUP
- Dor nas costas aguda ou crônica, que pode ser piorada pela hidratação ou esforço físico.
- Cólica renal
- Hematúria (sangue na urina)
- Pielonefrite ou infecção urinária de repetição
- Cálculos renais
- Hipertensão
- Insuficiencia renal ou até exclusão renal do lado afetado.
Estenose de JUP: causas e epidemiologia
A estenose de JUP é um problema mais comum em crianças, afetando cerca de 1:1,000–2,000 nascidos vivos, a prevalência é semelhante entre homens e mulheres (1:1).
Nos casos congênitos, isso é, presentes desde o nascimento, a estenose ocorre mais frequentemente no rim esquerdo (dois terços dos casos), mas pode acontecer bilateramente em 10-46% dos pacientes.
A ocorrência da estenose de JUP em adultos tem uma prevalência de 1:1500 indivíduos. Ela pode ser detectada nessa faixa etária tanto por falha no diagnóstico precoce quanto por obstruções adquiridas durante a vida como cálculos ou cirurgias prévias, chamado de causa secundária.
Em adultos, raramente a estenose de JUP é encontrada de maneira incidental nos exames de imagem. Habitualmente os pacientes tem sintomas de dor ou desconforto nas costas, geralmente piorados por hidratação vigorosa, diuréticos ou exercícios físicos.
As causas da estenose de JUP podem ser classificadas de duas formas, quanto a forma que a obstrução acontece (extrínseca x intrínseca) e/ou ao momento de aparecimento (congênita x adquirida ou secundária).
Nas causas extrínsecas alguma estrutura, geralmente algum vaso renal, comprime o ureter de fora para dentro. Nas causas intrínsecas um defeito na parede do ureter impede que a urina seja drenada de maneira eficiente.
Em relação ao momento de aparecimento, as causas congênitas estão presentes desde o nascimento enquanto as causas adquiridas (ou secundárias) ocorrem devido à alguma causa inflamatória ou cirurgia.
Segue a lista das causas mais comuns:
- Intrínsecas
- Congênitas: segmento aperistáltico de ureter; estreitamento verdadeiro; “kink” ureteral.
- Adquiridas: cálculo ureteral, manipulação ureteral endoscópica prévia, tumores.
- Extrínsecas
- Congênitas: vasos anômalos, rim em ferradura, duplicação renal
- Adquiridas: pólipos ureterais, cirurgias prévias.
Diagnóstico de Estenose de JUP
Ultrassom
A ultrassonografia é um bom exame para investigação inicial do trato urinário.
Esse exame pode identificar a presença de dilatações, identificar qual parte do trato urinário se encontra dilatada e também pode identificar outras alterações como cálculos renais.
Por outro lado, por se tratar de um exame examinador dependente e dinâmico, algumas alterações discretas não podem ser notadas e o urologista pode necessitar de melhor detalhamento para programação da cirurgia.
Tomografia computadorizada
A tomografia é o exame de escolha para identificação e estudo anatômico do trato urinário em pacientes com suspeita e/ou diagnóstico de estenose de JUP, possuindo uma sensibilidade de 97% e especificidade de 92% para esse problema [1].
Exames de imagem de alta resolução, como a própria tomografia ou a ressonância magnética, proporcionam um estudo anatômico detalhado da obstrução ( incluindo localização e a presença de vasos anômalos), pode identificar possíveis causas, como cálculos e tumores uroteliais, e podem fornecer informações importantes para auxiliar nas decisões relativas ao tratamento.
Além disso, as reconstruções anatômicas em 3D realizadas com esses métodos podem detalhar aspectos importantes da cirurgia, como número e localização dos vasos renais, posicionamento do sistema coletor, possibilitando um melhor planejamento da cirurgia.
Por outro lado, a presença de uma hidronefrose ou dilatação do sistema coletor não significa necessariamente a presença de estenose de junção pielo-ureteral e de obstrução, sendo importante realizar exames de medicina nuclear para determinar aspectos funcionais da drenagem renal.
Medicina Nuclear: cintilografia renal estática e dinâmica.
Os exames de cintilografia renal proporcionam a avaliação do funcionamento renal através da administração de um radiotraçador que ficará brilhante nos exames de imagem, possibilitando ao médico verificar a taxa de filtração renal e o tempo gasto para eliminar essas substâncias. Esse exame também é chamado de renograma diurético.
Existem dois tipos principais de cintilografias solicitadas na prática médica para avaliação de pacientes com estenose de JUP, são eles:
-> Cintilografia Renal Dinâmica (DTPA ou MAG-3): é o tipo de cintilografia mais importante nos casos de estenose de JUP pois avalia a filtração glomerular entre os rins separadamente, permitindo quantificar a taxa de filtração glomerular, determinar a função excretora e a presença de dilatações e seus aspectos funcionais, como fenômenos obstrutivos e refluxivos. Nesse teste frequentemente é utilizado o estímulo com diurético para auxiliar na interpretação da obstrução.
-> Cintilografia Renal Estática (DMSA): avalia a função renal de cada rim separadamente, podendo diagnosticar cicatrizes renais secundárias a infecções urinárias ou outras más-formações do trato urinário. A determinação da função renal auxiliar na decisão entre correção da estenose de JUP ou até mesmo retirada do rim (nefrectomia) em casos mais graves.
Tratamento da estenose de JUP.
A cirurgia é o tratamento principal da estenose de junção ureteropelvica (JUP) e deve ser indicado em pacientes sintomáticos (ex: dor, infecção) ou com prejuízo de funcionamento do rim afetado.
A cirurgia envolve uma plástica do sistema coletor renal, com retirada da área estreitada e/ou transposição da pelve renal sobre os vasos anômalos, seguida de reconstrução através de sutura absorvível. Esse procedimento possui o nome de Pieloplastia.
Durante a realização da pieloplastia é necessário posicionar um stent dentro da via urinária chamado de duplo J. Esse dispositivo favorecerá a drenagem correta do rim e deve ser retirado algumas semanas após a cirurgia.
O tratamento endoscópico com dilatações e endopielotomias endoscópicas tem sido deixado em segundo plano em vista dos seus resultados inferiores à pieloplastia.
Cirurgia Minimamente Invasiva: videolaparoscopia e robótica
As cirurgias minimamente invasivas são as opções de preferência no tratamento da estenose de JUP em adultos, visto que possuem a mesma eficiência para realização da pieloplastia quando realizada por cirurgiões habilidosos e necessita de incisões menores, proporcionando uma recuperação e retorno as atividades habituais mais rápido.
A escolha entre videolaparoscopia e cirurgia robótica vai envolver a complexidade do caso e os recursos financeiros envolvidos. A cirurgia robótica proporciona vantagens e maior facilidade no momento da realização da sutura intracorpórea, por outro lado, envolve maior custo, já que não é coberta habitualmente pelos planos de saúde.
Converse com seu médico e entenda como essas tecnologias podem ser utilizadas no seu caso individual.
Quando é necessário retirar o rim na estenose de JUP?
Infelizmente alguns pacientes apresentam casos graves e recebem o diagnóstico de maneira muito tardia, sendo possível que o rim afetado tenha perdido a maior parte da sua função, nesses casos pode não ser mais benéfico realizar a pieloplastia sendo indicado a nefrectomia.
A indicação clássica de nefrectomia se dá para pacientes que possuem uma função renal do rim afetado menor que 20%.
A retirada do rim (nefrectomia) pode ser não ser desejada em alguns pacientes e esse estudo demonstrou uma melhoria da função renal diferencial e dos sintomas em pacientes que foram submetidos à pieloplastia com função renal diferencial menor que 20%.
Dessa forma, apesar de não ser possível preservar o rim em todos os casos, somos mais permissivos na indicação de pieloplastia mesmo em casos de funcionamento renal prejudicado. Cada caso deve ser avaliado em suas particularidades antes de propor um tratamento específico.
Se você deseja saber como são realizadas as nefrectomias, escrevi esse artigo abordando tudo sobre o tema.
A estenose de JUP pode voltar?
O objetivo da realização da pieloplastia é a correção definitiva da estenose de JUP.
O sucesso do tratamento é considerado nos casos de melhora sintomática e melhora do padrão obstrutivo nos exames de imagem. A taxa de sucesso da pieloplastia é variável na literatura, geralmente acima de 90%.
Nos casos em que houve uma recorrência da estenose ou até mesmo falha no tratamento inicial, pode ser indicada uma nova cirurgia. A realização de uma segunda cirurgia trás desafios novos ao cirurgião, visto que a área operada não é mais virgem, podendo existir aderências e áreas inflamadas. Um recurso interessante nesse contexto é o uso da tecnologia robótica, mas também é possível realizar esse procedimento por via videolaparoscópica ou aberta.
Conclusão
Em conclusão, a estenose da junção ureteropélvica em adultos é uma condição urológica desafiadora que, se negligenciada, pode resultar em complicações sérias, incluindo aumento da pressão renal, hidronefrose e, eventualmente, falência renal.
A importância do manejo eficaz desta condição é incontestável, destacando a necessidade de identificação precoce de sinais e sintomas, um diagnóstico preciso e tratamento adequado. A compreensão profunda da anatomia, causas e opções terapêuticas, incluindo avanços minimamente invasivos, é fundamental para proporcionar uma abordagem eficaz e personalizada.
Escolha um urologista da sua confiança, que domine o assunto e que tenha habilidade com técnicas minimamente invasivas para obter o melhor tratamento possível.
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